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05 de dezembro de 2024

    Rio Grande (História, Geografia, Música e Poesia)


    Por Redação Clic Camaquã Publicado 14/05/2024
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    Foto: divulgação

    Leia a coluna de Catullo Fernandes (Arte, Cultura e História), escritor, poeta e pesquisador.

    Neste final de semana chuvoso resolvi produzir um trabalho diferente mesclando várias das vertentes culturais as quais me dedico. E como sou movido à música decidi que o caminho das águas seria por aí, reunindo clássicos do cancioneiro gaúcho, que se encaixam neste momento tenso e de reflexão. Ficou um pouco extenso é verdade, mas difícil entre tantas maravilhas musicais fazer um resumo. No final coloquei o link das canções selecionadas. Espero que curtam! Foto: Vista área parcial das ilhas do Camaquã.

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    RIO GRANDE (História, Geografia, Música e Poesia)

    NÃO… a enchente não está ocorrendo porque Barbosa Lessa escreveu “Balseiros do rio Uruguai”, e provocou: “Viva veio a enchente”, e na hora de cantar mudaram a palavra Viva para Oba.

    “Oba, viva veio a enchente

    O Uruguai transbordou

    Vai dar serviço p’ra gente
    Vou soltar minha balsa no rio
    Vou rever maravilhas

    Que ninguém descobriu.”

    NÃO… a enchente não é porque a Elis Regina interpretou com Tom Jobim “Águas de março”, e as águas chegaram atrasadas em maio, e se vingaram cantarolando:

    “É o pau, é a pedra, é o fim do caminho

    É um resto de toco, é um pouco sozinho

    É um caco de vidro, é a vida, é o sol

    É a noite, é a morte, é um laço, é o anzol.

    São as águas de março fechando o verão

    É a promessa de vida no teu coração”

    NÃO… a enchente não é motivada pela rivalidade Gre-Nal, quando nos anos 60, os tricolores brincavam que o Beira-Rio era uma bóia cativa, que poderia alagar, e por ironia do destino a Arena também foi construída num lugar de alagamentos.

    NÃO… a enchente não é um castigo divino porque muitos brasileiros de outros estados que, pelo seu jeito bonachão e autêntico, consideram o gaúcho arrogante.

    NÃO… a enchente não é uma má previsão do Mauro Moraes, na voz do José Claudio Machado, em “Milonga abaixo de mau tempo”:

    “Agarre amigo o laço

    Enquanto o boi tá vivo

    A ENCHENTE anda danada,

    Molestando o pasto

    Ao passo que descampa a pampa dos mil réis”

    E definitivamente a enchente NÃO é uma “Previsão” impiedosa composta pelo Adair de Freitas:

    “O tempo se armou de fato

    Lá pra o lado do Uruguai

    Vai chover barbaridade

    E sem poncho ninguém sai.”

    A Capitânia de São Pedro do Rio Grande do Sul foi criada em 1807, e em 1821 é elevada a condição de Província, e mais tarde após a Proclamação da República, tornou-se o Estado do Rio Grande do Sul. O nome originou-se de uma série de discordâncias cartográficas, quando se acreditava que a Lagoa dos Patos fosse a foz do RIO GRANDE, registrada por Frederick de Wit, em seu atlas de 1670.

    O RIO GRANDE como o próprio nome diz é um rio grande. Assim como nós seres humanos, que temos entre 60 e 70% de água no corpo, ele também é feito de águas. São 3 bacias hidrográficas e cerca de 90 rios, sem contar a maior laguna da América do Sul, a Lagoa dos Patos. Daí a origem do nome RIO GRANDE tanto da cidade quanto do Estado. Um dia toda esta água tinha que buscar o seu leito.

    A ENCHENTE é o resultado do descaso com a natureza, do desequilíbrio ambiental e da ganância dos homens, que acabaram por mudar o curso do RIO GRANDE. Agora como dizia Nico Fagundes cabe a cada gaúcho de todas as querências tomar tenência, e fazer uma prece com o Paulinho Pires, no ritmo de seu serrote:

    “Não deixem morrer meu rio

    Me ajudem por favor!

    O biguá que mergulhava, já morreu

    Água pé não dá mais flor.”

    Aqui nestas bandas das ilhas do Camaquã a súplica também ganha força na voz do cantador Helmo de Freitas, em “Meu rio”:

    “Ao longe se vê o clarão
    Do fogo queimando o mato
    Tarumã, cedro e angico
    Em carvão, taco e cavaco

    Os redemoinhos dançando
    Nesta água eu quero ver
    Não me matem este rio
    Ao menos enquanto eu viver…

    “Rio… Rio… Rio que mergulhou minhas lembranças

    Riooooooooooooo… da minha infância!”

    …E na pura poesia de “Arroio Lindo”, composta por Otacílio Meirelles, na interpretação impecável de Airton Madeira, ambos remanescentes do Grupo Os Tapes:

    Arroio lindo…

    Vai cantando tuas mágoas

    Na estação das enchentes

    Soluçando as corredeiras

    Vem arrastando madeiras

    Alagando os teus banhados

    Gemendo em fúria brava

    Derruba arranca e arrasa

    Nos campos de teus costados.”

    Mas apesar dos pesares, como diz o gaúcho, ainda há uma segunda chance. Que tudo isso nos sirva de lição. A gauchada assim como as extintas tribos indígenas arachanes chamadas de patos, está botando o peito n’água, e vão levantar a cabeça como gritou cantando Leopoldo Rassier:

    “Não podemo se entregá pros home

    Mas de jeito nenhum, amigo e companheiro

    Não tá morto quem luta e quem peleia

    Pois lutar é a marca do campeiro.”

    A palavra agora é RECONSTRUÇÃO… NÓS vamos reconstruir o RIO GRANDE assim como previu e pregou Vitor Ramil em “Semeadura”:

    “Nós vamos prosseguir, companheiro

    Medo não há…

    No rumo certo da estrada

    Unidos vamos crescer e andar

    Nós vamos repartir, companheiro

    O campo e o mar,

    O pão da vida, meu braço, meu peito

    Feito pra amar…”

    E logo, logo… ali na curva do rio o sol há de brilhar mais uma vez como revelou Barbosa Lessa, na canção eternizada na voz de Leopoldo Rassier, e mais recentemente numa releitura da camaquense Luana Fernandes:

    “Pôr-do-sol no Guaíba

    Aquarela de paz desenhada por Deus

    Pôr-do-sol no Guaíba

    Alegria da cor na tristeza do adeus.”

    O RIO GRANDE vai voltar a cantar suas canções de águas. Nossa capital Porto Alegre e todas a cidades atingidas (441 de 497) vão ser erguidas novamente. E todas estas mágoas de agora vão virar mais um daqueles causos de outrora contados pelos antigos tropeiros e peões em volta do fogo de chão: em 1941 o tempo ficou feio no Estado, mas em 2024 foi maior ainda e tudo televisionado.

    Se ainda não acreditas, confia nas lendas vivas do Sul, e segue os links das músicas. O Negrinho do Pastoreio continua acompanhando toda a sina do RIO GRANDE>

    BALSEIROS DO RIO URUGUAI – de Barbosa Lessa com Noel Guarany

    ÁGUAS DE MARÇO – Elis Regina e Tom Jobim

    MILONGA ABAIXO DE MAU TEMPO – de Mauro Moraes com José Cláudio Machado

    PREVISÃO – Adair de Freitas

    SÚPLICA DO RIO – Paulinho Pires com Fátima Gimenez

    MEU RIO – Helmo de Freitas

    ARROIO LINDO – Otacílio Meireles, na voz de Airton Madeira, com imagens de Alex Haas

    NÃO PODEMO SE ENTREGÁ PROS HOME – Leopoldo Rassier

    SEMEADURA – Vitor Ramil e Carlos Moscardini

    PÔR DO SOL NO GUAÍBA – de Barbosa Lessa com Luana Fernandes