Medida protetiva pode ser feita online no RS
Nova ferramenta busca frear violência contra mulheres. Violência doméstica em alta pressiona autoridades a facilitarem acesso à proteção

Após um dia marcado por seis feminicídios em diferentes cidades do Rio Grande do Sul, a Polícia Civil anunciou que vai liberar a solicitação de medida protetiva de urgência pela internet. A decisão, que vinha sendo planejada, foi acelerada diante da gravidade dos crimes e da urgência em ampliar o acesso das mulheres ao principal instrumento legal para romper o ciclo de violência.
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O novo serviço deve ser lançado ainda nesta semana. Com ele, mulheres em situação de risco poderão pedir proteção sem precisar sair de casa ou enfrentar a burocracia e o medo de ir até uma delegacia. O canal virtual deve funcionar 24 horas por dia e será integrado ao sistema de registro de ocorrências da Polícia Civil.
Medida protetiva: um direito que ainda não chega a todas
De acordo com a Polícia Civil, a maioria das vítimas de feminicídio no estado não tinha medida protetiva ativa. Estima-se que cerca de 90% das mulheres assassinadas por companheiros ou ex-companheiros não conseguiram, por diversos motivos, formalizar o pedido de proteção judicial.
O delegado Fernando Sodré, chefe de Polícia do RS, destaca que o medo e a dependência emocional ou financeira ainda são obstáculos. “Muitas mulheres sequer conseguem ir à delegacia denunciar. Esse novo sistema permite que o agressor não saiba da denúncia, aumentando a segurança da vítima”, afirma.
A ferramenta, que será lançada oficialmente nos próximos dias, permitirá o envio de denúncias e a solicitação imediata da medida protetiva. Após o registro online, o pedido será encaminhado ao Judiciário, que poderá deferir a medida em poucas horas.
Como funcionará o pedido de medida protetiva online
O novo sistema permitirá que a vítima acesse uma plataforma oficial da Polícia Civil e preencha um formulário digital. Nele, será possível relatar os episódios de violência, identificar o agressor e anexar provas, como fotos, prints de conversas e vídeos.
Uma equipe especializada analisará a denúncia, e o pedido de medida protetiva será encaminhado diretamente ao juiz de plantão. A medida poderá incluir o afastamento imediato do agressor, proibição de contato, restrição de acesso à residência e outras determinações de segurança.
O delegado Christian Nedel, diretor do Departamento de Proteção a Grupos Vulneráveis, reforça que a medida protetiva tem eficácia comprovada. “É o mecanismo legal mais importante que temos para romper o ciclo de violência. Agora, com o sistema digital, esperamos alcançar muito mais mulheres”, pontua.
Feminicídios em 24 horas escancaram a urgência de medidas eficazes
O anúncio da medida ocorre em um momento de extrema tensão no estado. Em menos de 24 horas, seis mulheres foram brutalmente assassinadas por seus companheiros ou ex-parceiros em diferentes cidades, como Parobé, Viamão, Santa Cruz do Sul e Bento Gonçalves.
Os crimes não possuem ligação entre si, mas têm em comum a motivação estrutural: o machismo. Segundo o delegado Sodré, trata-se de uma cultura enraizada de controle e posse sobre a mulher, que se manifesta em crimes bárbaros, muitas vezes anunciados por ameaças anteriores que não são levadas a sério.
Nenhuma das vítimas assassinadas tinha medida protetiva. Esse dado chocante reforça a tese de que o acesso à proteção precisa ser facilitado — e que a violência doméstica exige resposta imediata do Estado.
Medo, vergonha e isolamento: os obstáculos silenciosos da denúncia
Para muitas vítimas de violência doméstica, denunciar o agressor é um passo assustador. Há medo de retaliação, vergonha de se expor e, em muitos casos, isolamento social que impede até mesmo o contato com a família ou amigos. Por isso, a possibilidade de pedir uma medida protetiva de forma online pode salvar vidas.
O novo sistema também busca dar agilidade aos casos em que há risco iminente. Situações em que o agressor já ameaçou, agrediu ou tentou invadir a casa da vítima exigem uma resposta rápida, e o formato digital reduz a burocracia e o tempo de resposta.
Além disso, delegacias virtuais também ajudam mulheres que vivem em regiões afastadas ou que enfrentam dificuldades de mobilidade, tornando o acesso à Justiça mais democrático.
O papel da sociedade na prevenção do feminicídio
A luta contra a violência doméstica não é responsabilidade apenas das autoridades. Familiares, amigos, vizinhos e colegas de trabalho precisam estar atentos aos sinais de abuso e agir quando perceberem algo errado. Denunciar é um ato de empatia e proteção.
No Rio Grande do Sul, denúncias anônimas podem ser feitas pelo telefone 0800 642 0121, e o número 180 segue como canal nacional para orientação e apoio a mulheres em situação de violência.
A expectativa é que a nova ferramenta online sirva como modelo para outros estados e ajude a reduzir os índices de feminicídio no país. Mais do que um avanço tecnológico, trata-se de uma medida urgente e necessária diante de uma realidade cruel.