Amizade entre moradores de rua e seus cães será tema de documentário em Porto Alegre
Filme está em fase de produção e será bancado por meio de financiamento coletivo
Perambulando nas calçadas, dormindo sob marquises e empurrando carrinhos abarrotados de material de reciclagem. Uma vida dura. Mas nunca só. Assim se sentem as pessoas em situação de rua que têm, nos seus animais de estimação, companheiros para todos os dias.
— O Tobi mudou meu coração. Eu era uma pessoa muito solitária, com muita mágoa. Ele me trouxe amor, trouxe paz e felicidade. Mudou a minha vida — define Christian Pires de Souza, 30 anos, ao lado do vira-latas que o acompanha pela região central de Porto Alegre.
A amizade entre os sem-teto e seus mascotes será mostrada em um documentário que está sendo gravado na Capital. O Afeto e a Rua, ainda em fase de produção, contará a história de quem encontrou nos bichos mais do que uma parceria:
— Vemos muito essa relação. Um senhor contou que recebeu dinheiro pra matar um animal, mas não fez. Ficou com ele. Atualmente esse homem tem mais de 20 animais — conta o diretor do documentário, Thiago Köche, em referência Maktub Abdalla.
A ideia de documentar a relação dos pets com seus parceiros surgiu ao presenciar uma cena de carinho extremo nas ruas.
— Eu vi um homem dormindo de conchinha com o cachorro, no Bom Fim, e pensei que essa relação daria um filme. Queria contar essa amizade, o afeto e o carinho dos dois. E é mútuo, os dois se ajudando, para aguentar as dificuldades da rua — relembra.
Sem recursos públicos, o curta-metragem será bancado por um financiamento coletivo, por meio do site catarse.me/oafetoearua. Os valores arrecadados bancarão os custos de produção, mas uma parte será dividida com os personagens entrevistados para o filme — na compra de cobertores, roupas e o que mais elas precisarem, segundo o diretor.
As primeiras imagens foram captadas para divulgar e buscar apoio a realização do filme.
Homem diz ter se negado a vender cachorro por R$ 2 mil
Coberto com uma roupinha verde que estampa pegadas brancas, o vira-latas Tobi, de dois anos e meio, não desgruda do seu protetor. Na região do Centro, é tratado por todos com carinho e recebe ajuda de moradores e empresários.
— Onde eu trabalho (catando material reciclado) tenho várias madrinhas. Elas dão banho, dão ração, vacinam. É maravilhoso. Uma senhora saiu do banco, nos viu, e me pediu um abraço. Uma situação inesperada — diz Christian.
Há sete meses, ele vive próximo ao viaduto Imperatriz Dona Leopoldina, no bairro Cidade Baixa. Deixou Erechim após um incêndio destruir a casa onde vivia. Somado à perda do emprego em uma fábrica de calçados, decidiu tentar a vida na Capital, com o sonho — ainda não realizado — de conhecer o Beira-Rio. O estádio foi visto apenas por fora.
— Eu não tinha dinheiro para entrar. Assisti no telão do lado de fora. Ver a final (da Copa do Brasil) seria um sonho — afirma.
Sob a marquise de uma gráfica, diz que o dono da empresa aceita bem a presença dele e de Tobi. E revela que já foi assediado a vender o cãozinho:
— Um burguês mostrou um bolinho de dinheiro. Eu disse “pode me oferecer mil, dois mil (reais), que eu não vendo”. Não tem preço que pague. O homem saiu decepcionado, e ainda vieram umas senhoras que viram tudo e me ajudaram com um lanche.
